Depois que a leitura se tornou minha atividade favorita, a única prateleira do meu antigo apartamento deixou de dar conta dos livros que não paravam de chegar. Aquele metro e meio deu lugar à estante, que logo ficou pequena.
Entre 2020 e 20241, acho que quase todo mundo ficou excessivamente online e fez parte da cultura digital do excesso, da performance e da estetização, onde ter certas coisas, adotar uma estética ou ser visto como parte de um grupo, como o de leitores, reforçavam a sensação de pertencimento. Foi nessa época que criei um bookstagram e comecei a comprar mais. As coisas que me faziam sentir parte do grupo não eram apenas o livro que todo mundo estava lendo, mas também os marcadores, as flags e a poltrona bacana, entre outras coisas que tornavam a leitura mais… aesthetic.
Essa estetização (que eu também reproduzia) influenciou muito minhas dinâmicas de leitura e compras. Além disso, por muito tempo, senti que possuir coisas me trazia segurança. Comprar mais do que eu conseguiria ler dentro de um ano significava sempre ter algo para ler, assim como reservas de coisas preferidas garantiam que eu não ficaria sem elas. Percebendo esse comportamento, prometi comprar e acumular menos — o que consegui cumprir especialmente porque 2024 foi um terremoto que rachou meu mundo recheado de coisas. Foi um ano de gastos veterinários altos, em que o dinheiro salvou minha gatinha — e entendi que ter segurança, na maior parte da vida, depende de ter saúde e algum dinheiro guardado, não de coisas.
Isso transformou minha relação com tudo, tudo, tudo… incluindo os livros.
Foi aí que decidi sair do bookstagram, tanto para ter mais tempo offline quanto para largar certos hábitos e o ritmo acelerado de leituras, conteúdos e compras. Por isso, repensei muito nos últimos meses… percebi, por exemplo, que não faço questão de ter a edição física de vários livros que já estão na estante. Teria sido melhor comprá-los por um valor mais baixo (como os e-books costumam ter) e mantê-los no Kindle, deixando o espaço físico para aqueles que pretendo reler infinitas vezes. Não ter todos os livros lidos na estante não me torna menos leitora… só desmonta um pouco a minha *aesthetic*.
É claro que não vou me desfazer do que comprei, mas tenho buscado conhecer livros através de e-books e audiobooks em plataformas por assinatura. Se não encontrar o que quero, recorro às compras priorizando os e-books para economizar. Se, depois de ler, eu realmente quiser o físico, espero por uma promoção ou uma edição usada.
Mas me adaptei bem aos formatos digitais! Principalmente depois de simplificar meu processo de anotações. Preferindo escrever mais em vez de focar nas marcações feitas diretamente nos livros, não deixo a falta do objeto-livro afetar a experiência de leitura. Os formatos digitais são menos aesthetic, mas tenho me preocupado mais em encontrar equilíbrio na relação com a internet e com os livros, que por muito tempo estiveram emaranhados com meu eu-online. Para continuar aqui sem me perder entre excessos e comparações, preciso proteger não apenas o que quero ler, mas também como quero fazer isso, e seguir buscando um meio-termo sustentável aqui e na vida.
Sinto que a preocupação com “estar excessivamente online” pouco existia antes de 2020, só começou a ser amplamente discutida no ano passado e tem se intensificado cada vez mais. Mas pode ser só na minha bolha.
A estetização — muitas vezes — é um castelo suntuoso erguido sobre a areia. Acredito que muitas pessoas, assim como você — e eu também — estão percebendo o quanto construir uma base sólida para a nossa rotina é não apenas mais saudável, mas também mais coerente do que aquilo que se pode exibir nas redes sociais. Obrigada por compartilhar sua reflexão, Ju 🤍
Te entendo muito bem. Passei por esse processo a uns anos atrás. Ainda faço conteúdo sobre livros na internet, já faz mais de 10 anos, mas desde 2021 não compro quase nenhum livro. Vendi todos os meus num acesso de desapego (até livros que eu tinha autógrafos internacionais adquiridos em bienais) e hoje todos que termino de ler - que tenho físico - eu troco no sebo. No fim das contas, eu sempre tenho livro "novo" na estante para ler. Também sou daquelas que se adaptou bem com o kindle, eu amo ler no digital apesar de também adorar as páginas de um livro físico.